sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A nova cara do Atlântico sul



A ilha venezuelana de Margarita abriga hoje e amanhã** um encontro de cúpula tão importante que em vez dos 7 gatos pingados de sempre (os eternos G7 ou G8), irão se reunir pela segunda vez 66 chefes de Estado e representantes de governo da África e da América do Sul, a ASA. Uma medida de sua envergadura é a cobertura mínima da mídia. Debatemos, de preferência, profundidades petrolíferas e aviões franceses (ou americanos, suecos, o que seja), que tocam na fantasia de sermos o que nunca fomos: ricos, modernos e brancos. Com a “transferência de tecnologia” subimos mais um degrau em direção ao primeiro mundo, deixando pra trás nossas negras ou índias realidades.


Mas antes de voar em jatos, o primeiro mundo educa sua população, e seus loiros habitantes são tão altos e fortes por dispor de comida na mesa e um serviço de saúde que preste. É prioridade ter subsolos ricos? Repasse a história das Minas e me diga. Ao colocarmos os pés no chão, vemos que ASA pode unir produtivamente países depauperados, mirando justamente romper esse ciclo. E o momento é propício, pelo maior comprometimento de governos sul-americanos e africanos (empurrados pela maior participação de seus setores populares) com a solução dos problemas sociais e de dependência externa. 


Como tecnologia, petróleo e poder bélico interessam mais, lembro que também nesses quesitos a reunião é proveitosa. Cuba pratica transferência tecnológica há muito tempo, fora da lógica mercantilista e cujos produtos - educação e saúde são exemplares - têm impacto direto no déficit social de países pobres. Mesmo sem Cuba, não faltam à ASA, e seu caleidoscópio de países, avanços tecnológicos intercambiáveis. Quanto ao petróleo, seis membros da ASA pertencem à Opep, sendo que Venezuela e Nigéria são dois dos maiores detentores de reservas e exportadores, elite a que se juntará o Brasil. Unidos, africanos e sul-americanos têm mais chance, dada a hegemonia dos grandes consumidores de petróleo, de privilegiar os investimentos internos de que necessitam. Por fim, desequilíbrios militares de fato preocupam. Agora mesmo a Colômbia tece um acordo para instalar sete bases militares dos EUA em nosso continente, atentado à soberania de que também sofre a África, por pressão econômica ou pela submissão de dirigentes alienados de seu povo. Acordos de cooperação mútua - econômica ou militar - são sempre benéficos a essas maltratadas regiões do globo.



Brasil e Nigéria são, de cada lado do Atlântico, os fiadores do encontro. Mas é patente a importância da Venezuela na disposição soberana que permeia os objetivos da ASA. Concordo com o articulista que disse que Chávez é uma “ameaça continental”. Mas não uma ameaça militar, e sim ao desprezo que sentimos por nossa história e condição (povos transfigurados, dizia Darcy Ribeiro) e à admiração que cultivamos pela cultura espúria que nos impede de andar com as próprias pernas.

** Publicado em O Tempo, 26/09/09

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